Debates e aprovação do Regimento marcam segundo dia da 4ª Conferência Nacional LGBTQIA+
- Maalik Franco
- há 1 dia
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Com participação ativa das delegações e clima de retomada democrática, evento avança nas discussões sobre direitos, diversidade e políticas públicas
O segundo dia da 4ª Conferência Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, realizado nesta quarta-feira (22), em Brasília, foi marcado por um clima de mobilização, escuta e reconstrução coletiva. A conferência reafirmou o compromisso do Estado e da sociedade civil com a formulação participativa de políticas públicas. No plenário e nos corredores, o sentimento era unânime: orgulho de participar de um processo que reafirma a democracia como prática viva e compartilhada.
Antes do início dos painéis temáticos, as delegações aprovaram, por aclamação, o Regimento Interno da conferência, documento que define as regras de funcionamento e deliberação da etapa nacional. O texto, debatido publicamente entre 6 e 15 de outubro, recebeu 82 propostas de emenda, das quais parte foi incorporada pelo Conselho Nacional LGBTQIA+, reforçando o caráter participativo e transparente do processo.
De acordo com Zezinho Prado, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e integrante do Conselho Nacional, a aprovação do texto simboliza o amadurecimento institucional da conferência. “Estamos pactuando um processo democrático, no qual cada proposta e cada voz têm valor”, afirmou.
A conselheira Janaína Oliveira destacou que o regimento é a base que permitirá à conferência cumprir sua principal finalidade: “traduzir a escuta social em propostas concretas”.
Aula magna destaca papel da coletividade e da resistência
A manhã começou com a aula magna da deputada federal Ruth Venceremos, ao lado da secretária nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+, Symmy Larrat. Em uma fala poética e combativa, Ruth emocionou a plenária ao recitar versos de Marinês — “Eu chego lá, queira ou não queira eu chego lá” — e afirmou que o Brasil que renasce da luta LGBTQIA+ é o Brasil que insiste em viver e resistir.
“Nossos direitos são a única forma de existir plenamente: poder sair às ruas, estudar, trabalhar e amar com dignidade”, afirmou Ruth, ao defender que a consolidação da Política Nacional recém-instituída representa o reconhecimento da diversidade como pilar da democracia.
A deputada também defendeu a inclusão da pauta LGBTQIA+ nos instrumentos oficiais do Estado, como o Censo e o orçamento público. “Para ser um Brasil democrático, justo e soberano, pessoas LGBTQIA+ precisam estar no orçamento”, declarou.
Grupos de trabalho e continuidade dos debates
As discussões da tarde avançaram sobre temas centrais da conferência, com foco no enfrentamento à violência e no direito ao trabalho digno. No Eixo 1, participantes ressaltaram a necessidade de políticas integradas e com orçamento garantido para combater as múltiplas formas de violência LGBTQIA+, defendendo o acolhimento humanizado e a responsabilização efetiva de agressores.
Já o Eixo 2 trouxe reflexões sobre inclusão produtiva, igualdade de oportunidades e valorização da diversidade no mercado de trabalho. Representantes de movimentos sociais e do governo destacaram iniciativas de formação e empregabilidade, como o Programa Empodera+, e reforçaram que o acesso ao trabalho é um pilar da cidadania e da dignidade.
No Eixo 3, as discussões abordaram a interseccionalidade como eixo estruturante das políticas públicas, ressaltando que gênero, raça e classe se cruzam nas formas de opressão enfrentadas pela população LGBTQIA+. As falas destacaram a urgência de uma educação inclusiva e de políticas formuladas a partir dessa perspectiva múltipla. Também foram debatidos os desafios da internacionalização dos direitos LGBTQIA+, com ênfase na democratização dos espaços globais de decisão e na ampliação da participação de representantes da sociedade civil nos fóruns internacionais sobre direitos humanos.
O foco do Eixo 4 esteve na institucionalização da Política Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+ e na consolidação de mecanismos permanentes de gestão, orçamento e monitoramento das políticas públicas. As falas destacaram a importância de transformar conquistas recentes em ações estruturantes e sustentáveis.
A secretária nacional Symmy Larrat apresentou a Portaria nº 1.825/2025, que formaliza a política e reúne suas ações no portal LGBTQIA+ Cidadania, fruto da mobilização e da ocupação política da comunidade. A portaria estabelece as diretrizes para formulação, execução e monitoramento de políticas públicas focadas na igualdade, enfrentamento da discriminação e garantia de direitos.
Vozes da base
Entre as pessoas delegadas, o sentimento é de reconstrução democrática e de fortalecimento da participação social. A delegada Bruna Benevides, presidenta da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), destacou o significado político da conferência. “Não estamos aqui apenas para debater políticas públicas, estamos construindo um projeto de país em que nossas identidades e existências sejam reconhecidas como dignas de direitos fundamentais”, afirmou.
Para Carlos Magno,

secretário de Comunicação da ABGLT e fundador do Selo de Minas Gerais, a conferência marca a retomada de um ciclo interrompido. Ele ressaltou que, após um período de apagão nas políticas públicas e na participação social, o encontro simboliza a reconstrução da cidadania LGBTQIA+. “Esta conferência reafirma que nossa população é parte essencial do país e que o Estado precisa responder às nossas necessidades básicas, ao mesmo tempo em que celebra a força da militância que se dedica cotidianamente à defesa dos nossos direitos”, avaliou.
A delegada Chintia Abreu, conselheira municipal LGBT em São Paulo, reforçou que o processo conferencial é, acima de tudo, um exercício de democracia viva. “Sem as pessoas LGBTQIA+, não há democracia possível neste país”, afirmou. Para ela, o espaço da conferência é também um chamado à responsabilidade coletiva para garantir que as vozes ouvidas em Brasília se traduzam em políticas concretas nos próximos anos.


